sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O Círio

Não gosto de maniçoba, pato no tucupi, açaím tucupi, tacacá e outros. Mas não sou menos paraense que ninguém. Nunca perdi um Círio. Nunca. Colaborou para isso o fato de ter morado, desde o nascimento, em um prédio no trajeto da romaria. O apartamento, até hoje, fica lotado de parentes, amigos, amigos de amigos, minha família. Uma vez, meu pai me levou até a subida da Presidente Vargas. Acompanhamos a passagem da berlinda e depois seguimos atrás. Fomos até a sede do Clube do Remo. Lá meu pai ficou entre amigos e eu, pus-me bisbilhotar e observar a sede, seus frequentadores. Retornamos ao apartamento para o almoço. A memória trai, mas é o que lembro. No mais das vezes, era acordar cedo, com os foguetes dos estivadores, e correr para o banheiro, escondendo-se de visitas que já haviam chegado. Depois, receber amigos, primos, tios, enfim. E assistir meu pai em um de seus momentos mais felizes. Passava de grupo em grupo. Bebidas, somente após a passagem da Santa! E quando Ela vinha, todos às janelas, eu, meus irmãos, minha mãe e meu pai, juntos, emocionados. Era passar e já surgia um violão, alguém com pandeiro, o whisky rolando generoso e começava outra festa. Delival Nobre, meu pai, amigos, todos se divertindo. Descíamos até a Praça para comprar brinquedos cirianos. Ainda hoje faço isso. Faço para o menino que me habita. Eu me lembro de ir ao Largo. Da pavimentação em tábuas, barracas de madeira, bares, onde cantava Edna Fagundes, a rainha do brega, na época. e os brinquedos. Hola, Tira Prosa, Montanha Russa, Cavalinhos, Trem Fantasma, Casa dos Horrores. Uma vez, para não passar vergonha, topei alegremente ir com amigos no Trem Fantasma. Bastou o carrinho entrar na escuridão e fechei os olhos. Tinha medo. Na saída, despistei e eles não perceberam. Enquanto isso, tenho dois primos, que moravam nas cercanias do Largo e eram o terror, da Casa de Horrores. Entravam e iam jogando bombinhas, fósforos acesos nos "monstros", que gritavam de medo. Muito bom. Outro primo, na Roda Gigante, quando nosso assento estava no ponto mais alto, destrancava a barra de segurança e punha-se a fazer estrepolias, para nosso desespero. Era o Círio.
Hoje, continuo morando no trajeto do Círio. Recebo amigos, parentes. Acordo cedo por conta dos foguetes, ligo a tv e vejo onde está a berlinda. Mas quando Ela se aproxima, desço até o apartamento de minha mãe. Ficamos juntos, acompanhando a passagem Dela. Não sou devoto de Nazaré. Mas é Maria que está ali. Quando passa, sinto toda a energia que a berlinda recebe e retransmite. É algo brilhante, forte, emocionante. Momento único. Difícil explicar. Os que vêm de fora, sempre dizem que é muito, muito maior do que pensaram, após receberem informações.  Mesmo nos tempos em que não estava morando no prédio, acordava cedo, botava as crianças para correr, conosco, na "contramão" do Círio, até o apartamento. Não gosto dos pratos paraenses. Conheço poucas cidades do Pará. Sinto-me às vezes, estrangeiro em minha própria casa.  Mas nunca perdi um Cirio. Tomara que seja sempre assim. Feliz Círio para todos. E a falta que faz meu pai!

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