sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

EU TE AMO MESMO ASSIM

É certo que não estarei aqui nas comemorações dos 450 anos de Belém, mas nos 350 eu já tinha meus 11 anos de idade e lembro que houve um concurso público para escolher uma música alusiva aos festejos. Minha mãe compôs uma marchinha, que vivia cantando pela casa, “Belém, de Pedro Teixeira, Belém da Igreja da Sé, Belém também de Caldeira, do Círio de Nazaré”. Nunca esqueci. Ela não se inscreveu. Visitei o novo Roxy no Shopping Bosque e me pus a admirar a paisagem, tão recente, a rodovia com carros zunindo, o imenso prédio, que até poucos meses não estava lá. A cidade mudando, crescendo, engolindo municípios em uma voragem incrível. Eu me lembro do prédio da Booth Line, no início da Presidente Vargas, arquitetura inglesa, bonito, sóbrio, substituído por uma bobagem da Caixa Econômica. Passeei de bicicleta no asfalto recém implantado na 15 de agosto, Presidente Vargas. Não lembro dos bondes, mas os trilhos estavam lá. À noite, todos passeando sobre o asfalto. Conheci e brinquei no Grande Hotel, com meu amigo Nelson Lima e o filho do gerente, a quem todos chamavam “Grego”. Lembro das mesas na calçada, de sua beleza. Assisti filmes no Paramazon, que ficava na Piedade e hoje, após milhares de mudanças, abriga uma boate gay. Ah, eu me lembro da Tiradentes, sem asfalto, terra batida, assim como a Henrique Gurjão, que em certo ponto, tínhamos de andar sobre tábuas, por conta do igarapé. E o cinema Palácio? Meu avô, Edgar Proença, dizia, como chiste, que além do Manoel Pinto da Silva, para ele, já era outro município. No seu tempo, a cidade ardia nessa ponta, que ainda chamamos de centro. Para mim, também. Sempre estive aqui, o mais distante, em Batista Campos. Às vezes íamos até uma casa de campo, no Country Club Lago Azul, onde chegamos a passar férias. Era distante. Uma viagem. Minha avó dirigia até Ananindeua onde comprava frutas na feira. Hoje, a cidade engoliu tudo. Espero que ainda preservem nas ruas, os nomes de meu avô e de meu pai, pioneiros ali. Do apartamento em que morava, por cima das árvores, conseguia ver a “testa” da Basílica de Nazaré. Hoje, há um paredão de prédios, na frente. A cidade muda velozmente. Seus problemas, também. Uma vez, com meus oito anos, fui assaltado na Praça da República. De bicicleta, desfilava com uma “besta” e uma aljava com setas  feita a partir de um invólucro que servia para esquentar a mamadeira de minha irmã, ainda bebê. Ameaçou-me com seu tamanho e levou a “besta” e a aljava, que cobiçava, certamente, também para brincar de cavaleiro. Não, a bicicleta ficou comigo. Imaginem. Hoje, o que temos para festejar os 400 anos da cidade? Nossos políticos são incompetentes. Não conseguiram perceber a dimensão de sua tarefa, na medida da necessidade da metrópole. Uma cidade do nosso porte precisa de técnicos profissionais. Nenhum plano de urbanismo foi pensado, muito menos executado. Nas eleições, deixamo-nos levar por raivinhas paroquiais, mentiras glamorosas e vingancinhas. Como nos deixamos levar por isso? A culpa é nossa. Do nosso voto. Vivo no centro da cidade, mas não consigo imaginar como as pessoas que moram em torno da Augusto Montenegro, da Br e outros, não se desesperam e reagem com o sofrimento diário, injusto, brutal e cretino. Há muito o que dizer. Me pediram que escrevesse algo para festejar os 400 anos. Não consigo. E quando penso na música de meu pai e minha tia Adalcinda, choro. “Há muito, que aqui no meu peito, murmuram saudades azuis do teu céu”. Eu te amo mesmo assim, Belém.

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