sexta-feira, 11 de março de 2016

AOS SÁBADOS

Aos sábados, acordo cedo. Não posso dizer a razão. Os que sabem acham que sou maluco. Paciência. No verão o sol já se anuncia. Nestes dias de inverno a escuridão prolonga um tanto sua passagem. Nas ruas, o povo da night em carros que passam velozes, perigosamente. Há também velhas caçambas carregadas de alimentos, vindas do Ver o Peso. Há garçons de pescoços espichados aguardando o ônibus que nunca chega. E os primeiros que já estão despertos, indo para o trabalho. Muita gente correndo. Antigamente, homens solitários, mas agora correm em grupos onde pontificam mulheres, muito bem, mulheres no atletismo, de todas as idades. A essa altura o sol já está reinando e o trânsito cresce em movimento. Aqui na Presidente Vargas, Dona Zilda, que chegou às cinco, já está com seu café quase acabando. Ela espera a Banca do Alvino abrir para comprar seu cigarrinho matinal e um dedo de prosa. E a Banca, às vezes, abre mais tarde. Eu e outros viciados em informação chegamos a ajudar nas portas de correr para abraçar nossos jornais. Há quem ande na Praça da República. Alguns veteranos, muitos novatos, com roupas novas, tênis estalando de novo e que lá não se demorarão, após sentir as dores do exercício no corpo de quem não malha. Costumo passear com meu Antônio, o Golden retriever, que alguns chamam de “o cão que é gato”. Ele conhece o terreno. Cheira os locais de sempre e decidimos o melhor caminho naquele sábado. Às vezes vamos margeando a Oswaldo Cruz até onde ficava a maloca, e conversamos com amigos, madrugadores, vendedores de carros, outros que levam seus cães para passear. Há um senhor que vai à Praça de manhã e à tarde. De pé, olha para o horizonte e reza. Não sei qual sua religião, mas ele tem fé. Uma correria na esquina com a Riachuelo. Uma moça chora. Alguém passou e arrancou seu cordão. Um homem em uma moto segue na direção em que o meliante correu. Alguns minutos depois, volta e devolve a jóia para sua dona. Era um vigilante que se preparava para deixar o serviço. O perneta acorda e pede algum para o café. Blake hoje amanheceu cantando músicas que ninguém entende. Na praça, sentado em um banco, está o travesti mais melancólico que conheço. Ele pede um cigarro. Pergunto o que faz fora da “batalha”. É cozinheiro. Um homem alto, de rosto anguloso, com imensas sandálias de salto alto, todo lânguido e triste. Muito triste. Às vezes, de casa, o vejo lá fora jogado em uma soleira qualquer, sol alto, parecendo curtir uma ressaca imensa. No outro final de semana lá está ele, começo da noite, cheio de otimismo. A Praça, imunda. Há uma obra sendo feita em alguns dos coretos e na fonte, mas já demorou tanto tempo e nada parece ser feito! O mato cresce nas alamedas, as árvores cheias de ervas daninhas, pivetões circulam com seus olhares ameaçadores e definitivamente não é um ambiente para crianças passearem. Aos domingos, uma imensa feira se instala, a prefeitura apresenta grupos de brega, barracas vendem churrascos e as pessoas sentam em qualquer lugar. Não há opção, ordenamento, nada. E ainda passa o Bento, carreatas, todos fazendo barulho. Eu sei como a praça era bonita. Acompanho desde que nasci. Nesta manhã de sábado, percebo um ângulo bonito e faço uma foto, que mando para o instagram. Mesmo nesse caos, a praça sugere coisas boas. Meus amigos engraxates chegaram. Os que “olham os carros”, também. E MC do Senhor Jesus novamente anuncia um grande show. Olha para mim e diz: aqui eu sou assim, mas eu sou famoso, sou muito conhecido, tenho um público. E o sábado segue seu curso.

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