sexta-feira, 10 de junho de 2016
TÁ LÁ UM CORPO ESTENDIDO NO CHÃO
Era
pouco depois do meio dia. Sol a pino. Na calçada em frente ao Edifício Palácio
do Rádio, um pequeno grupo cerca um casal que está deitado. Um homem forte
tenta reanimar uma mulher. Pergunto a alguém que me diz que ela parece ter uma
overdose. Há três soldados, dois homens e uma mulher, que parecem atônitos.
Digo-lhes para afastar as pessoas de perto. Obedecem, mas logo tudo volta ao
que era. Chega ambulância do SAMU. Os médicos e atendentes agem rapidamente. O
homem levanta e parece também estar aturdido. Tenta evitar que os médicos
imobilizem a mulher na maca, para que não se debata. É contido, mas está bem
alterado. A mulher tem o olhar esgazeado. Murmura palavras desconexas. Tenta
mover-se, levantar-se, mas já está presa. Um dos soldados me diz que era
overdose de crack. Penso que junto a isso está a fome. Não pode dar certo. O
SAMU age rapidamente e a leva para a ambulância. A multidão se desfaz.
Encontrar essas pessoas jogadas ao chão é coisa corriqueira na Presidente
Vargas. Há sempre homens e mulheres que parecem dormir um sono eterno, após
bebida, droga ou até stress. A avenida principal da cidade está completamente
abandonada. Há três enormes prédios apodrecendo sem que nada seja feito. O da
Receita Federal, que sofreu incêndio e hoje é frequentado por drogaditos,
bandidos e mendigos. O do INSS, na esquina com Manoel Barata e mais adiante, o
do antigo Edifício Bern. Suas calçadas são imundas, com excrementos humanos e
outros dejetos. Há uma favela na esquina com a Aristides Lobo. Passo por lá diariamente
e não posso imaginar a força política daqueles lúmpens que passam o dia jogando
cartas, arengando uns com os outros por conta de Remo e Paysandu, com um
restaurante nojento que funciona à base do PF. De lá vem um cheiro terrível que
empesta o ambiente. Entra governo, sai governo, eles se mantém. E carrinhos que
vendem de um tudo. Estão sempre atentos à fiscalização que passa de vez em
quando. À noite, na calçada dos Correios, uma multidão se reúne para fumar
crack e aguardar grupos de pessoas que levam mingau, outros alimentos e tentam
leva-los para a religião. Penso que essas pessoas saem com as almas leves,
certas de ter feito uma boa ação. Será? A Polícia tem dificuldade em lidar com
isso. São consumidores de drogas. Um problema social. Levar presos? Soltar logo
depois? Ou prender justamente os municiadores dessa droga, que é da pior
qualidade, misturada em tudo o que não presta? Na Primeiro de Março, esquina
com Riachuelo, onde funcionava o Teatro Cuíra, passam o dia aguardando
transeuntes para roubar e trocar por uma peteca. A Praça da República, que
passa por lenta reforma que deverá ficar pronta às vésperas da eleição é outra
chaga na avenida. Capim alto, cercados, excrementos, drogaditos, assaltantes,
tudo o que não presta. Mais adiante, à frente das Lojas Americanas, há como que
um corredor polonês para quem passa. A crise econômica parece chegar até nesse
comércio absurdo e informal. Pelo menos uma barraca dessas que vende refeição,
na esquina com a Manoel Barata, faliu. E continuam as pessoas sentadas na rua,
se deliciando com pratos regionais preparados e servidos sem qualquer higiene.
Nem todos sabem. A Presidente Vargas já foi muito bonita. Logo na subida tinha
o Edifício da Booth Line. O Hotel Central, antes da C&A era belo. No Bern, funcionavam
consultórios médicos. A praça e seus monumentos. O chafariz da Praça da Sereia.
O Grande Hotel, majestoso. O prédio do café que funcionava onde hoje está o
Basa. Mas isso é passado. O presente é triste.
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