sexta-feira, 15 de julho de 2016

UMA NOITE NO SÉCULO PASSADO

Vocês não sabem o que é ter entre 14 e 15 anos, final da década de 60, século passado, em uma boate no Mosqueiro, Netuno Iate Clube, e depois de algumas músicas para dançar “solto”, ouvir os primeiros acordes de “This guy’s in love with you”, com B.J. Thomas. A luz negra está ligada, lá fora as ondas de maré alta batem no muro de arrebentação. É mês de julho, verão total. A pista que estava lotada, em um momento, esvazia e enche novamente de jovens com o rosto e as costas ardendo do sol que pegaram nas praias. Você olha para o outro lado do salão e vê a garota dos seus sonhos finalmente sentada na mesa, com seus pais e irmãs e considera se, finalmente, terá a coragem de ir até lá e com o olhar firme, convidá-la para dançar. Você ensaia mentalmente a cena. Passara os outros dias pensando nisso. Tomara algumas doses de cuba libre para descontrair. É agora, você decide. Sai do balcão do bar cheio de certezas e principalmente, dos sonhos de um adolescente ingênuo e apaixonado. E quando vai chegando, tremendo de emoção, vê aquele rapaz mais velho, mais seguro de si, chegar até ela, cumprimentar seus pais e leva-la para a pista. Você se sente entre o derrotado e um certo alívio pelo medo que sentia dela dizer não. Fica para outra vez. Outros sonhos. Vê-la, no dia seguinte, na praia, olho comprido e ela, talvez, continuando a conversa com aquele rival repentino e cruel. Ou não. Você chega, voz trêmula, dá boa noite aos pais e a convida para dançar. Ela aceita. Você a leva para a pista. Passa o braço. Sente aquele corpo de menina se juntando ao seu. O perfume, o cabelo que teima em entrar no seu olho. É pura mágica. Você balbucia algumas palavras, tipo “adoro essa música. Você também gosta?” Ela sorri apenas e diz que também gosta. E aos poucos, o corpo chega mais próximo, o que chamavam, antes, “colar” e agora você percebe sua respiração forte e imagina que deve dizer alguma coisa, quem sabe, “quer namorar comigo?”. Meu Deus, isso seria de uma audácia incrível. Talvez fosse melhor, ao final da música, conversar um pouco. Seus pais deixariam? Eles conhecem sua família, pode ser que sim. Todo esse tsunami de pensamentos cruzam a cabeça desse adolescente ingênuo e apaixonado. Acabou a música, e os Bee Gees são ouvidos com “I started a joke”. Incrivelmente ela não pede para parar de dançar. Continuam ali, rosto com rosto e até mesmo outros sinais que o corpo apresenta você ignora. O mais importante é sentir aquele corpo colado ao seu, a música, o lugar, o sonho. Os pais fazem um sinal e ela se descola e diz que precisa ir. Você pergunta se pode conversar com ela, no dia seguinte, na praia. Ela diz que sim e lhe dá um beijo no rosto, que fica em chamas. Você se despede, fica zanzando pela boate completamente tonto e sem palavras. Os amigos zoam e você nem dá bola. Vai para casa e não consegue dormir. Relembra, ponto por ponto, o que se passou. Você era uma criança até ontem e agora sente-se poderoso, orgulhoso da aceitação de uma menina. A coragem de convidá-la a dançar. E na manhã seguinte, você se encaminha para a praia, na direção da barraca da família e lá encontra o “gavião” de ontem e mais uns dois rapazes, por conta das irmãs de sua paixão. Você estaca, pensa se terá coragem de ir até lá e colocar-se em cena. Olha para si, para o rival, mais encorpado, cheio de gás e já não sabe o que fazer. E então, dezenas de anos mais tarde, outro século, você ouve “This guy’s in love with you”, com B.J. Thomas e toda uma época feliz e romântica, volta à lembrança.

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