sexta-feira, 18 de agosto de 2017
REPULSA
Como
todos sabem, o Rio de Janeiro hoje é uma cidade falida, cheia de problemas
gravíssimos, milhares de pessoas sem emprego ou sem receber salários. Nas ruas,
uma guerra civil conta agora com o Exército na fiscalização, sem deter a
violência. E, no entanto, empresários que parecem ser sócios em uma corretora
de valores, acabam de inaugurar um teatro. Um teatro! Fica em uma área no
terreno do Jockey Clube onde antes havia uma sala onde algumas peças foram
apresentadas. Agora é uma casa para as Artes Cênicas, com todos os equipamentos
necessários. Quando leio uma notícia dessas e olho à minha volta, sinto-me
insultado. Sinto repulsa. Até uns 25 anos atrás, Belém contava com uma cena
teatral cheia de atrações e casas cheias. Sim, ao longo do tempo, muita concorrência
surgiu, mas principalmente, houve um desmonte do setor. Um abandono. Pior, uma
deliberada ação para minar o movimento, pela negação dos espaços aos grupos
locais, com uma lei cultural que inibe patrocinadores, todos com medo de terem
seus livros abertos pela fiscalização. Pela falta completa de qualquer programa
de investimento na criação de plateias, formação de mercado, apoio para que os
grupos possam, aos poucos se manter, certos de ter um retorno de bilheteria aos
seus trabalhos. Funcionários públicos, orgulhosos de sua ignorância, preferem
promover um festival de ópera, gastando muito dinheiro, tendo, com récitas
lotadas, um total de oito mil pessoas, talvez, enquanto milhões de outros
paraenses, em todo o Estado, nada têm para desfrutar de Cultura. Ao longo desse
tempo todo, sem nenhuma fonte de renda, atores e técnicos procuraram outros
empregos, até mesmo no Estado e por isso, sem disposição para manifestações
contrárias. Têm medo de perseguições. Outros, fizeram concurso e agora são
Doutores e Mestres na Escola de Teatro da Ufpa, formando atores e técnicos a
cada semestre, ao que parece, interessados mais em atuar como professores. O
que isso resultará, não sei. Nesse tempo todo, a Cultura se profissionalizou.
Hoje, é geradora de empregos, impostos, fora seu imenso valor de ser ponto de
partida para a discussão em sociedade, dos assuntos que são de todos. Um povo
que não consegue refletir sobre o mundo em que vive, está perdido. Por isso,
estamos perdidos. O que sei é que poucos grupos suportaram toda essa pressão e
continuam, depois de terem vivido de prêmios da Funarte e Ministério da Cultura
e agora, por sua própria conta, fazendo Teatro. Apresentam-se em palcos
alternativos, espaços em casas, praças, pela missão de espalhar Cultura e para
resistir. Os que ainda tentam teatros menores, são constrangidos em pagar, além
de taxas altíssimas, um “por fora” aos funcionários por, estranhamente, não
serem contratados para trabalhar no horário em que os teatros funcionam. Tudo
isso sem contar que é preciso levar garrafão de água, papel higiênico, fabricar
ingressos, fatores mais que evidentes que não são bem vindos. Em cidades como
São Paulo, shoppings são obrigados a ter equipamentos para arte, principalmente
teatro. Aqui, em Belém, nenhum teatro consta dos planos desses empresários que
ficam ricos na cidade, mas a odeiam. E leio e vejo fotos da inauguração de um
novo teatro no Rio de Janeiro em meio à maior crise que já enfrentou.
Esperaremos até o ano que vem para nos livrar-nos desse funcionário público que
odeia Cultura paraense? O mal que já foi feito não tem tamanho. Quantas
gerações foram perdidas nesses 25 anos? Serão precisos vários anos para a
recuperação de tudo o que foi destruído.
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