sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

TENHO UM MEDO DE MORTE DA VIDA

Caetano Veloso, na letra que fez para a melodia de Beto Guedes, diz “o medo de amar é o medo de ser livre”. Concordo, mas gostaria de emendar e dizer “o medo de viver é o medo de ser livre”. Isso me ocorreu após assistir a um filme onde a mocinha, que desafiara a família conservadora, morreu de Aids. Já não sou mais criança e posso dizer que até agora, vivi sem medo da vida. Fui educado para fazer o que quisesse e respondesse por isso. Mesmo assim, ainda demorei um tanto para encontrar meu caminho. Hoje, olho para trás, contemplo as minhas peripécias, minhas aventuras, desafios, vitórias e derrotas e fico satisfeito. Talvez quisesse fazer um pouco mais ainda. E penso em dizer aos meus filhos, que sejam amigos, protejam-se uns aos outros para que possam viver e ser livres. Sejam amigos. Sejam bons. Ao longo do tempo, vi garotos, nem bem com 16 anos e já preocupados, sem viver a melhor fase da vida, estudando para se formar com 22 anos. E vão se matar de trabalhar, porque realmente nada está fácil, mas esqueceram de viver. Ganham dinheiro, compram carros gigantescos, apartamentos, viajam para Miami, tudo de maneira sôfrega, como quem quer compensar um tempo não vivido plenamente. Gente rica e infeliz na profissão. Um médico que gostaria de ter sido filósofo, engenheiro que gostaria de ter sido músico. Ao contrário, conheço médicos que apenas são felizes em seus consultórios ou salas de cirurgia, onde seu mundo está perfeito, com os aparelhos e sua técnica. Aqui fora, a vida é muito complicada. Há outra música que lembro, diz “de vez em quando me vou a algum lugar”. Sim, precisamos respirar. Ouso dizer, que mesmo a imensa quantidade de brasileiros que enfrenta terríveis dificuldades para viver, no dia a dia, também precisa respirar. E assim, afogueados de tanta luta, não há onde desabafar, dar um tempo, viver para ser livre. Os compromissos nos prendem como grilhões. A sociedade cobra comportamentos, atitudes. Engolimos e cumprimos o papel que já está escrito. Não sou expert, tampouco pesquisei em livros, inclusive de auto ajuda, para escrever isso. Convivi com minhas dúvidas, lutei, trabalhei incessantemente, mas vivi e consegui ser livre. Esse caminho encontrei na arte. Fiz música, escrevi peças de teatro, livros. Em todos esses gêneros, apresentei meu trabalho ao público, me expus. Fui e sou livre. Conheci e frequentei grupos de pessoas dos mais diferentes comportamentos e opiniões. Hoje, posso dizer que não pertenço a nenhum grupo específico, mas a todos eles. De cada um, tiro o melhor para a minha liberdade de espírito e pensamento. Procuro contribuir não com críticas, mas com argumentos na direção daquilo em que acredito. Sou imperfeito, erro muito, como todos nós, mas a idade me deu a condição de refletir a respeito de meus atos. Por isso, neste instante, escrevo como diriam “ao sabor da pena” ou “ao sabor dos dedos nas teclas”, que nosso principal compromisso deve ser este, de viver para ser livres. E de vez em quando escapo para Mosqueiro, Farol e ali reencontro uma vida inteira, no cenário, em todas as pessoas que ali estavam na minha infância/adolescência. Olho para o nada e as vejo na praia, jogando futebol, empinando papagaios, dançando no Netuno Iate Club e namorando. Fico no Hotel Farol e aproveito para respirar, desanuviar, lembrar, contemplar e sorver um tempo sem tempo para nada a não ser viver o dia, carpe diem, naquele vento que despenteia e o sol que se põe tendo a Ilha dos Amores como moldura. Como é bom!

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