sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

NOSSOS 15 ANOS

É impressionante como, mesmo nos dias de hoje, com redes sociais, internet e outras modernidades, ainda aconteçam festas de 15 Anos. Nem os Bailes de Debutantes passaram de moda. Então me ocorreu uma crônica divertida. Um ou dois anos antes, anunciou que queria festa de 15 Anos. No mínimo, igual a da prima. A mãe adorou, o pai enlouqueceu. Os 15 Anos da minha filha serão devidamente comemorados. Desde já começamos uma economia de guerra nesta casa. Farei pessoalmente os enfeites de mesa. Os brindes. Lista de convidados. Alugaremos o melhor buffet. Esses bregas aqui da rua vão morder a calçada de inveja!, disse a mãe. O pai tirou a poupança. Chamaram o “profissional de 15 Anos”, ao invés de um cerimonialista. Um erro. O fotografo, meu Deus, o fotografo para o book! A modista e o vestido! Ah, ela precisa emagrecer. Onde já se viu? Tranca em casa, nada de Roxy Bar, Mormaço, boates, até pra não ficar com a cara “batida”. E olha, nada de whisky nacional, viste? E a mulher circulando de braços dados com a biba profissional. E o dinheiro saindo. E a debutante, com cara de “sabe que eu mereço isso?” A avó veio do interior. Vou preparar minha famosa salada de frutas. Acho uma besteira gastar dinheiro com salão de festas. Por mim, fazia lá no quintal. Bastava passar uma vassoura.. A avó era uma preocupação. Nervosa, impressionável, adorava um escândalo. Toma conta da tua mãe. Olha que ela vai aprontar! Hum, melhor que a tua que é toda fresca e nem vem ajudar.

A festa começou. Receberam convidados. Crianças correndo e destruindo a decoração. A biba, profissional, de um lado para o outro, falando no rádio. A garotada querendo funk. Só depois da valsa! E então vem a cerimônia, tipo “Esta é a sua vida”. Passa filme. A menina desfila com modelos diferentes. Os caras fotografam e filmam. Quase duas da manhã, a ceia esfriando, todo mundo com fome e o show continua. O DJ toca “Carruagens de Fogo”, o ápice da festa. A aniversariante surge diáfana, brilhante, uma rainha e a biba corre dando ordens. O pai foi sugerir e levou safanão. Agora não, tá? Aqui mando eu. O pai contou até mil. Fumaça! Fumaça! A biba ordena e os ajudantes ligam a máquina de fumaça, para fazer o cenário. Luzes! Música! Fumaça! E lá vem a menina, obedecendo as rígidas marcações da biba profissional. Dona Menina, a avó, percebe algo acontecendo. Leva um choque. Ao ver a neta em meio àquela fumaça toda, levantou gritando Fogo! Fogo! Vocês não estão vendo que o vestido da minha neta está pegando fogo? Façam alguma coisa! As pessoas, paralisadas, sem compreender onde estava o problema. Dona Menina, célere, no salvamento da neta, pensa rápido, vai até as mesas onde a ceia e a sobremesa estavam postas. Pegou a terrina, sim, a terrina onde estava sua famosa salada de frutas. A biba percebeu em um relance. Agarrou-se às ancas de Dona Menina. Lutaram por alguns segundos. Dona Menina ganhou. A biba rolou no chão chorando de raiva. A aniversariante finalmente olhou, curiosa. Tarde demais. Dona Menina derramou a terrina sobre a neta, para apagar o incêndio. Ensopada, cabelo desgrenhado, vestido lambuzado e ante o ridículo da situação, voltou desesperada para os bastidores. A biba tinha seu décimo terceiro desmaio de raiva. Ganhou um bofetão do pai, que lavou o peito. Chorou copiosamente. A mãe foi confortar e levou esculhambação. A discussão foi geral e sobrou para a biba que saiu correndo. Acabaram todos no quintal da casa, enchendo a cara até de manhã. E olha que nem passaram uma vassoura, pensou Dona Menina, cheia de razão.

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

BELÉM TEM SAMBA NO CARNAVAL

Talvez, pelo texto da semana passada, muitos pensem que fui ou sou um folião extremado. Não, acho que não. Claro que se penso no ontem com a mentalidade de hoje, posso fazer mau julgamento. Enfim, falava mais alto a juventude, o entusiasmo, as meninas e a vontade de se mostrar com mais idade do que tinha. Publiquei no Facebook, como sempre e muitos lembraram gostosamente daquele carnaval. Todos a partir de uma faixa etária. Hoje, o carnaval que brincam é completamente diferente daquele. Completamente. As pessoas se divertem, bebem, beijam e voltam para casa arrasadas. Antigamente, também, mas o que cantam, onde dançam, como dançam, tudo diferente. Quando se escreve lembrando também as Escolas de Samba, a turma de hoje duvida. Samba em Belém? Realmente, fora pequenos guetos, o samba na cidade, principalmente no carnaval, não é mais ouvido. Quando criança, morando na Presidente Vargas, dormia antes do Boêmios da Campina passar. Do alto, via aqueles paletós vermelhos, calças brancas e sapatos brancos, zanzando pela Riachuelo. Uma noite, Rosenildo Franco me levou a uma reunião na antiga Lavanderia Paraense, onde hoje está o Pátio Belém. Tramavam a volta do Quemzão. Artistas plásticos, poetas, músicos, publicitários,

atores,  envolvidos em um entusiasmo maravilhoso. Lembro da construção da sede do Quem ali na Wandenkolk, essas mesmas figuras carregando tábuas. Primeiro era espaço reduzido, um corredor. Depois ficou bem maior. E eu conheci Luiz Guilherme Pereira, o eterno presidente, apaixonado por aquilo. Vi Rubão sambar e desfilar, juntamente com Margarida, a Porta Bandeira. E havia Katia, a sambista ou rumbeira, como chamavam, que tinha, como diz o Chico, “um tufão nos quadris”. E o chefe da bateria, que infelizmente no instante em que escrevo, não lembro o nome. E todos se entendiam por um bem maior. Puxa, como era bom ver aquilo funcionando. O primeiro enredo homenageou Eneida de Morais. O segundo, o Marajó. Na autoria dos sambas, grandes figuras, como João de Jesus Paes Loureiro e Waldemar Henrique. Que dupla! Então criaram o concurso de samba enredo. Meu irmão queria participar. Todas as figuras importantes estavam compondo. O tema era “Cobra Norato, Pesadelo Amazônico”. Me pediu uma letra. Meu pai fez a música e ele venceu. Uma das grandes emoções da vida é ver uma obra sua sendo apresentada. O desfile era na Presidente Vargas. Íamos na ultima ala, dos compositores. Agora lembro de mim, tentando esboçar passos de samba. Impossível. Mas ali naquela festa de cores, a bateria estourando, o povo cantando e batendo palmas, é uma das melhores coisas da vida. Você criou e estão cantando. Anos depois, quando o enredo era o ilustre Comendador Mário Sobral, os compositores se reuniram e criaram um samba conjunto. Inclui a frase “é pai dégua doutor, pai dégua é fazer amor com meu amor”. Novamente na avenida, agora na Doca, acho, passando pela emoção. E vocês me perguntam como é que um compositor de samba enredo nào é folião? Não sou. Fazia as letras. No desfile, tomava algumas e pulava de alegria. Outro orgulho foi ter desfilado quando meu pai foi enredo do Quem São Eles. Foi muito legal. Uma pena que as autoridades, por incompetência, não tenham percebido a possibilidade de lucro com o desfile. E a Cultura tenha sido abandonada, causando também o abandono das Escolas. Há, sim, possibilidade de ressurgimento, com gestão profissional de todos. Mas isso é outra história. Duas coisas são certas: não sou folião e em Belém, tem samba no carnaval, sim.

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

UM DOMINGO NO BANDALHEIRA

Aquele domingo de carnaval prometia. A chuva caía e parava, caía e parava. O que fazer? Afinal, é o tempo dela. Acabamos de almoçar mais cedo. Bastava calção e camisa, por cima a mortalha que era o uniforme, a fantasia do bloco e todos estavam prontos. A primeira parada era na casa do amigo, um dos líderes, para o apronto final. O ambiente era de euforia, cada um tentando se mostrar mais animado que o outro. Alguém trouxe uma garrafa de rum ou vodka, não lembro. Outro chegou com um pacote de Ki Suco, sabor morango. Pronto, a batida para garantir o pique no resto da tarde/noite estava garantida. De lá, fomos para o ponto de encontro, um bar/lanchonete que ficava na Generalíssimo, esquina com aquela rua que passa ao lado da Basílica. A galera chegava aos poucos. Pronto, agora também a banda contratada e, de repente, era hora da saída. O nome do bloco era Bandalheira. Meu amigo, um dos líderes, não lembro dos outros, mas Bosco Moisés acompanhava a turma, com um carro cheio de bebida, preferencialmente de uma marca que, penso, ele era representante. A essa altura, o teor etílico do grupo era bem alto. O percurso também não lembro, mas o destino era a Praça da República, onde milhares de jovens esperavam a passagem dos blocos, para dançar carnaval. Vários outros blocos também tinham a praça como destino. O Vila Farah, Piratas da Batucada, muitos, todos muito animados, meninos e meninas cantando as velhas marchinhas que duraram tanto tempo e até hoje, dependendo da festa, ainda causam comoção. Durante o resto da semana, os comentários dizendo que este ou aquele estava maior ou mais animado. Isso fazia com que, em outros quarteirões, vilas, ruas, enfim, a galera se animasse e constituísse outros blocos. Sim, havia muita paquera e muita gente passando mal por excesso de bebida e outros baratos. Mas a bandinha rugia um frevo e ia na base do “pega o meu cabelo pra não se perder e terminar sozinha”. Havia um cordão de isolamento para evitar que gente sem fantasia se metesse e desfigurasse a coisa. Os haters de hoje já vociferariam dizendo que era preconceito contra o povão e tal. Havia alguns seguranças, porque é claro, onde há meninas e meninos brincando e bebendo, pode haver alguma rusga. Minha prima era a mais velha. Meus velhos a encarregaram de segurar a onda de “nosotros”, por ter mais juízo. O problema é que ela emburacou na subida da Presidente Vargas. Para passar na frente do prédio e acenar para a família que estava no terraço, todos a amparamos, de tal maneira que pareceu que ela cumpria as instruções. SQN. Passei comportado e bem postado na frente da Assembléia Paraense, que começava o Baile dos Brotinhos. Na janela, a namorada. E na esquina da Carlos Gomes, pintou a Turma da Bailique para estragar a brincadeira. Meu amigo, bem forte, encarou, junto com os seguranças. Depois me contou que no meio do frege, ao dar um “balão” no oponente, ao encara-lo, percebeu que era um dos seguranças do bloco. Pior, era o “Cancão de Fogo”, famosa figura da luta livre. O negócio foi pedir desculpas, piscar um olho e procurar outras vítimas. Sem condição física para encarar um porradal daqueles, quedei-me entre uns carros e fiquei assistindo. Ainda seguramos a prima que partia em direção a uma desafeta, aproveitando para descontar qualquer parada antiga. Assim como começou, acabou. O bloco seguiu seu caminho. Nós findamos no Pronto Socorro, para uma injeção de glicose na prima, que sobreviveu. E ainda emendei para a AP, ao som do Guilherme Coutinho. Evoé!

sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

ESSE ANO NÃO VAI SER IGUAL AQUELE QUE PASSOU?

O carnaval não me desperta a paixão. Talvez seja uma certa melancolia que me domina a maior parte do tempo. Adolescente, participava de tudo, até mesmo do Bandalheira. Uma noite, Rosenildo Franco me levou a uma reunião em uma Lavanderia que ficava ao lado da Mesbla, onde hoje está o Pátio Belém. Eles começavam a reativar o Quem São Eles. Mas foi meu irmão que participou intensamente. Vai rolar um festival de samba enredo e eu quero participar. Faz uma letra e o pai faz a música. “Cobra Norato, Pesadelo Amazônico”. Ganhamos. Virei integrante da ala de compositores. Logo eu. Estive ainda em mais um enredo, sobre o ilustre Comendador Raymundo Sobral. O carnaval foi sendo minado por confusões internas, prefeitos não muito simpáticos e teve uma reanimada com a Aldeia Cabana, de Edmilson Rodrigues. Ele teve a idéia correta. No começo de tudo, os desfiles eram no Boulevard Castilhos França. Depois, na Presidente Vargas e ainda, na Doca. Eram lugares importantes, embora ocupados por classes mais altas, indiferentes à festa local, preferindo viajar. A falta de Cultura, durante mais de vinte anos, que estamos vivendo, afastou as pessoas. Os intelectuais, músicos, escritores, atores, que brilhavam nos desfiles e eram aplaudidos, reconhecidos, não passam mais, salvo alguns renitentes. Mais uma vez a onda negativa e política, deixou abandonada a Aldeia, seus projetos e crivou-a de críticas. Durante o segundo semestre, acho, a turma do carnaval reuniu pontualmente aos sábados, em uma livraria que também frequento. Tive vontade de ir lá dar uma idéia, mas sabe, os caras são do ramo, estão preocupados e fiquei intimidado em dar “pitaco”. Hoje, a maioria das pessoas acha absurdo haver samba em Belém. Deviam fazer como em Manaus com os “bois”. Aqui é diferente. Os marinheiros que estavam em terra, durante Momo, a partir da Riachuelo, tocavam samba e foram formando platéia. Havia os “Boêmios da Campina”, maravilhosos. Criança, não me deixavam assistir ao desfile, por tarde da noite. Mas via aqueles ternos vermelhos e brilhantes, as calças e sapatos brancos, maravilhosos. Talvez essa noite negra que se abateu sobre a Cultura tenha apartado os mais jovens do samba. Talvez. O Estado ou o Município também não se interessam em receber turistas. Então, quem é que se interessa pelo carnaval de Belém? O povão. Para essas pessoas ávidas por uma diversão, o carnaval é grande atração. Deixa o pessoal da Doca ir pra Salinas, sair em Escola do Rio de Janeiro, enfim. O povão precisa se divertir. Embora exista a Aldeia Cabana, ouso sugerir o entorno do Estádio Edgar Proença, o Mangueirão. As partes internas serviriam para oficinas e construção de carros. Arquibancadas do lado de fora ficariam lotadas por gente humilde, recebendo a festa da alegria genuína. Assim como o brega e o tecnobrega se espalham, é preciso começar cedo, pelas mídias alternativas. Enredos decididos, todos com prazo para apresentar o samba official. E então, divulgados os concorrentes, vamos para um concurso para decidir quem é o melhor, com a nota valendo para o desfile. Imaginem o local da festa, lotado com as torcidas de cada escola. Imaginem o concurso para a melhor sambista, passsista, rumbeira (que havia no início) , enfim, de cada escola. Isso daria outro barulho. Mais ainda, cada escola poderia realizer ensaio em espaços próximos ao Mangueirão, como forma de atrair mais simpatizantes. Isso renderia dinheiro, grana, para ficarem menos dependents das esmolas do governo. Devo ter outras idéias que não me ocorrem agora, mas finalizando, penso que os artesãos dos carros alegóricos precisam ser respeitados. Após o desfile, esses carros são deixados nas ruas, expostos a chuva e a ação de desocupados que os depredam impiedosamente. E, no entanto, quem não pôde comparecer ou assistir pela televisão, pode estar querendo conferir a riqueza e detalhes dos trabalhos. É preciso levar os carros para um espaço aberto, para que fiquem em exposição até a quarta feira de cinzas. Será mais uma crônica na direção do “Sonhos, sonhos” e a música de Lennon, “You may say I’m a dreamer”? Que bom seria se algo assim fosse acatado e a festa voltasse a ser resplandecente, como já foi, agora com um público interessado, vibrante e agora, pleno de diversão.